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CONTO DE INVERNO, ATO II, Cena II

O mesmo, O interior de uma prisão. Entram Paulina e alguns criados.

PAULINA - O carcereiro da prisão! Chamai-o.,Dizei-lhe quem eu sou.
(Sai um dos criados.)
Nobre senhora! Não há corte na Europa suficiente para tua pessoa. E agora presa!
(Volta o criado com o carcereiro.)
Bom senhor, conheceis-me?

CARCEREIRO - Se conheço? Sim, como uma senhora muito digna, a quem muito venero.

PAULINA - Nesse caso, por obséquio, levai-me até à rainha.

CARCEREIRO - É impossível, senhora, pois tenho ordens expressas em contrário.

PAULINA - Quanta formalidade, para o acesso impedir de visitas amistosas à honestidade e à honra! É
permitido, dizei-me, ver uma de suas damas? Emília, por exemplo?

CARCEREIRO - Se quiserdes, minha senhora, retirar os criados, mandarei vir Emília.

PAULINA - Então chamai-a. Retirai-vos.
(Saem os criados.)

CARCEREIRO - Contudo, é necessário que eu assista à conversa.

PAULINA - Pois que seja.
(Sai o carcereiro.)
Ultrapassa os preceitos da própria arte todo esse esforço para deixar preto o que é, em si mesmo, branco.
(Volta o carcereiro, com Emília.)
Gentil dama, a graciosa rainha como passa?

EMILIA - Tão bem quanto, reunidos, o permitem tão alto posto e tanta desventura. Os sustos e as
tristezas - jamais dama tão delicada suportou tamanhas - provocaram-lhe o parto antes do tempo.

PAULINA - Menino?

EMÍLIA - Não, menina; bela criança, forte e cheia de vida. Sua vista consola a rainha, que lhe fala:
"Minha pequena prisioneira, somos ambas inocentes'

PAULINA - Atrevo-me a jurá-lo: malditos sejam esses perigosos acessos do monarca. E necessário
contar-lhe o que houve; tem de saber tudo. Isso compete a uma mulher; incumbo-me de lhe dar a notícia.
Se disser-lhe palavras doces, quero que na língua me rebentem feridas, cessando ela de servir de
trombeta para a minha cólera de feições congestionadas. Emilia, por obséquio, recomenda à rainha meus
préstimos. No caso de ela querer confiar-me a pequerrucha, mostrá-la-ei ao monarca, prometendo
servir-lhe de advogado diligente. Quem sabe se ele ficará mais brando à vista da menina? Muitas vezes o
silêncio da cândida inocência persuade onde os discursos fracassaram.

EMÍLIA - Muito digna senhora, tão patente é vossa honra e a bondade muito própria, que não pode
deixar de ter bom êxito vossa nobre entrepresa. Não conheço senhora alguma mais talhada para tão
grande iniciativa. Queira Vossa Senhoria esperar no quarto anexo, que logo eu vou participar à rainha
vossa nobre proposta. Hoje mesmo ela pensara nisso; mas não se atrevera a dar essa incumbência a
qualquer nobre, com medo de um fracasso.

PAULINA - Emilia dize-lhe que eu saberei uso fazer da língua. Se fluir dela eloqüência como audácia no
peito ora me estua, é quase certo ser eu bem sucedida.

EMÍLIA - Deus vos guie. Vou ver logo a rainha. Por obséquio, vinde para mais perto.

CARCEREIRO - Se a rainha se decidir a vos confiar a criança, não sei ao que me exponho, pois careço
de ordens nesse sentido.

PAULINA - Ora, senhor, não precisais ter medo; prisioneira do ventre era essa criança; mas por normas
e processos da grande natureza conseguiu resgatar-se e ficar livre. Participar não pode, assim, da cólera
do soberano, nem tem culpa alguma da falta da rainha se houve falta.

PAULINA - Podeis ficar tranqüilo.Por minha honra, hei de pôr-me de permeio entre vós e o perigo.
(Saem.)