Alexandria. Um quarto no palácio. Entram Cleópatra, Charmian, Iras e Alexas. CLEÓPATRA - Onde está o homem? ALEXAS - Não quer vir; tem medo. CLEÓPATRA - Vai, vai buscá-lo. (Entra o mensageiro.) Vinde aqui, senhor.
ALEXAS - Bondosa Alteza, Herodes da Judéia a olhar-vos não se atreve senão quando vos achais bem disposta.
CLEÓPATRA - É meu desejo vir a ter a cabeça desse Herodes. Mas para quem hei de pedi-la, estando de lá ausente Antônio? Isso, aproxima-te.
MENSAGEIRO - Graciosa majestade!
CLEÓPATRA - Viste Otávia?
MENSAGEIRO - Vi, sim, rainha venerável.
CLEÓPATRA - Onde?
MENSAGEIRO - Senhora, em Roma. Contemplei-lhe o rosto e vi-a entre o irmão dela e Marco Antônio.
CLEÓPATRA - É tão alta quanto eu?
MENSAGEIRO - Não é, senhora.
CLEÓPATRA - Falar a ouviste? Fala baixo ou alto?
MENSAGEIRO - Ouvi, sim; fala baixo.
CLEÔPATRA - É mau indício; ele não a amará por muito tempo.
MENSAGEIRO - Como! Amá-la? Oh, por Ísis! Impossível.
CLEÓPATRA - É também o que eu penso. Charmian, fala sossegada e é baixota. E sua marcha, revela majestade? Pensa nisso, se é que já contemplaste majestade.
MENSAGEIRO - Ela se arrasta, tanto faz mover-se como ficar parada, é a mesma coisa. Parece mais cadáver do que gente, estátua pura, não dotada de alma.
CLEÓPATRA - Estais seguro disso?
MENSAGEIRO - Salvo se olhos eu não tiver.
CHARMIAN - Não temos três pessoas no Egito que melhor observar saibam.
CLEÓPATRA - Ele sabe o que diz, estou notando. Então ela carece de atrativos. Este homem sabe ajuizar as coisas.
CHARMIAN - Otimamente.
CLEÓPATRA - E a idade dela? Quantos anos terá?
MENSAGEIRO - Ela era viúva, minha senhora.
CLEÓPATRA - Charmian, escuta: viúva!
MENSAGEIRO - Penso que tem trinta anos.
CLEÓPATRA - E o feitio do rosto, ainda te lembras? É redondo ou alongado?
MENSAGEIRO - Oh! bem redondo; chega a ser defeituosa.
CLEÓPATRA - A maior parte das pessoas assim são abobadas. E de que cor são os cabelos dela?
MENSAGEIRO - Senhora, escura, e tem tão baixa fronte quanto ela própria desejar pudera.
CLEÓPATRA - Recebe este ouro. A mal levar não deves minha aspereza de antes. Tenho idéia de encarregar-te novamente disso, pois vejo que dás conta do recado. Vai preparar-te. As cartas estão prontas. (Sai o mensageiro.)
CHARMIAN - É um sujeito capaz.
CLEÓPATRA - Muito, realmente. Pesa-me, agora, tê-lo molestado. Por sua descrição essa criatura não vale grande coisa.
CHARMIAN - Nada, nada, minha senhora.
CLEÓPATRA - Ele já viu, decerto, majestade, sabendo, porventura...
CHARMIAN - Se já viu majestade? Isis me ampare! Servindo-vos aqui há tanto tempo?
CLEÓPATRA - Tenho uma coisa ainda a perguntar-lhe, boa Charmian. Mas isso pouco importa. Leva-o para onde eu vou fazer as cartas. Talvez ainda conciliemos tudo.
CHARMIAN - Garanto-vos, senhora. (Saem.)